Existem
áreas do pensamento cristão, e não só do pensamento mas também da vida, onde as
semelhanças e as diferenças são tão difíceis de distinguir que muitas vezes nós
temos problemas em defini-las e não sermos completamente enganados. São erros
tão habilidosos em imitar a verdade que ambos são constantemente confundidos.
Assim,
é de uma importância crítica que o cristão tire o máximo possível de cada
recurso que Deus criou para livrar-se do engano. E estes recursos são: oração, fé, constante meditação na Palavra,
obediência, humildade, pensamentos sérios e definidos e a iluminação do
Espírito Santo.
Estes
são tempos em que as almas dos homens têm sido testadas. Os últimos dias estão
sobre nós e nós não podemos escapa-los; precisamos triunfar em meio a eles.
(1 Timóteo 4:1-2)
Por
mais estranho que possa parecer, o perigo hoje é maior para os cristãos
fervorosos do que para os mornos e acomodados. Aquele que busca as melhores
coisas de Deus está sempre ansioso em ouvir alguém que ofereça uma maneira pela
qual ele possa obtê-las, especialmente se isso lhe for apresentado por uma
pessoa com uma personalidade atraente e uma reputação de elevada piedade.
Agora,
o nosso Senhor Jesus, o grande Pastor das ovelhas, não abandonou o seu rebanho
à misericórdia dos lobos. Ele nos deu as Escrituras, o Espírito Santo e os
poderes naturais de observação; “mas
ponham à prova todas as coisas e fiquem com o que é bom.”, disse Paulo (1
Tessalonicenses 5:21). “Amados, não creiam em qualquer espírito, mas examinem os
espíritos para ver se eles procedem de Deus, porque muitos falsos profetas têm
saído pelo mundo.” Escreveu João (1 João 4:1). “Cuidado com os falsos profetas.
Eles vêm a vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por dentro são lobos
devoradores. Vocês os reconhecerão por seus frutos. [...]” nos advertiu o Senhor (Mateus
7:15-16).
Para
aqueles que querem uma regra pela qual seja possível testar todas essas coisas, eu
vou compartilhar aqui um pequeno segredo através do qual eu tenho testado
minhas próprias experiências espirituais e impulsos religiosos por muitos anos.
Em
suma o teste é o seguinte: Esta nova doutrina, este novo hábito religioso, esta
nova visão da verdade, esta nova experiência espiritual – como ela têm afetado a minha atitude na minha relação com Deus,Cristo,
a Sagrada Escritura, comigo mesmo, com outros cristãos, com o mundo e com o
pecado?. Através desse teste sétuplo nós podemos provar tudo aquilo que
advém da religião.
1.
Um teste vital de toda e qualquer experiência religiosa é como ela afeta a
nossa relação com Deus, nosso conceito de Deus e a nossa atitude para com Ele.
Qualquer doutrina, qualquer experiência que sirva para exalta-Lo é,
provavelmente, inspirada por Ele.
O
coração do homem é como um instrumento musical que pode ser tocado pelo
Espírito Santo, por um espírito maligno ou pelo próprio espírito do homem.
Emoções religiosas são praticamente a mesma coisa, não importa quem as esteja
operando. Muitos sentimentos prazerosos podem ser provocados num momento de
pouca adoração ou até mesmo quando essa adoração é idólatra. A freira que se
ajoelha “com fôlego de adoração” diante de uma imagem da Virgem está tendo uma
genuína experiência religiosa. Ela sente amor, temor e reverência, todas estas
são emoções prazerosas, como se ela de fato estivesse adorando a Deus. As
experiências místicas dos Hindus e Sufis não pode ser varridas de lado como se
fossem um mero fingimento. Também não ousaríamos repudiar os altos voos
espirituais dos espíritas e de outros ocultistas como se fosse fruto de suas
imaginações. Eles podem, e algumas vezes realmente tiveram, encontros genuínos
com algo ou alguém além de si mesmos. Da mesma maneira os cristãos são algumas
vezes guiados em experiências emocionais
que estão além do seu poder de compreensão. Eu já me encontrei com cristãos assim
enquanto eles avidamente me questionavam se as suas experiências eram ou não “de Deus”.
O
grande teste é, o que essa experiência
fez ao meu relacionamento com o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo? (Apocalipse
4:11)
2. O
próximo teste é, como essa nova
experiência tem afetado minha atitude para com o Senhor Jesus Cristo? Independente
do lugar que a religião dos dias atuais tenha dado a Cristo, Deus deu a Ele a
mais alta posição nos céus e na terra. Ele deve estar no centro de toda
doutrina verdadeira, toda prática aceitável e toda genuína experiência cristã.
Um cristianismo sem Cristo pode soar contraditório, mas ele existe e é um
fenômeno real nos nossos dias.
Novamente,
há experiências psíquicas que podem emocionar àquele que busca e conduzi-lo a acreditar
que ele, de fato, teve um encontro com o Senhor e foi levado até o terceiro
céu; mas a verdadeira natureza do fenômeno só é descoberta mais tarde quando a face
de Cristo começa a desaparecer da consciência da vítima.
Se,
por outro lado, a nova experiência cuida de tornar a Cristo indispensável, se
ela tira nosso interesse dos nossos sentimentos e o coloca em Cristo, nós
estamos no caminho certo. Tudo aquilo que torna o Cristo querido à nós é,
certamente, advindo de Deus. (Mateus 3:17; Atos 2:36 e 4:12; e João 14:6)
3.
Outro teste revelador é, como isso afeta
a minha atitude para com as Sagradas Escrituras? Essa nova experiência,
esta nova visão da verdade, floresce da própria Palavra de Deus? Qualquer coisa
originada fora das Escrituras deve, por este exato motivo, ser suspeita até que
possa ser comprovada que ela está de acordo com a Palavra. Não obstante o alto
conteúdo emocional, nenhuma experiência pode ser provada como genuína a menos
que nós possamos encontrar capítulos e versículos que a atribuam autoridade nas
Escrituras. (Isaías 8:20)
Tudo
aquilo que é novo ou excepcional deve também ser visto com muito cuidado. Na
última metade de século um grande número de ideias sem nenhuma base nas
Escrituras ganharam aceitação no meio cristão, simplesmente por dizer que estas
eram as verdades que seriam reveladas nos últimos dias. A verdade é que a
Bíblia não ensina que haveria uma nova luz e experiências de avanço espiritual
nos últimos dias; ela ensina exatamente o
oposto. Tenham cuidado com qualquer homem que afirme ser mais sábio que os
apóstolos ou mais santos do que os mártires da Igreja Primitiva.
Embora
o verdadeiro poder resida não na letra do texto mas no Espírito que a inspirou,
nós jamais devemos subestimar o valor da letra. O texto da verdade está para a
verdade assim como o favo está para o mel. Um serve de receptáculo para o
outro. Mas a analogia para por aí. O mel pode ser removido do favo, mas o
Espírito da verdade não pode e não opera em separado da letra das Sagradas
Escrituras. Por esta razão um crescente conhecimento no Espírito Santo vai,
necessariamente, significar um maior amor pela Bíblia.
4. Continuando,
nós podemos provar a qualidade da experiência religiosa através dos seus
efeitos na nossa própria vida. O Espírito Santo e a decaída natureza humana são
diametralmente opostos um ao outro. (Gálatas 5:17) Antes que o Espírito de Deus
possa agir criativamente nos nossos corações Ele deve primeiro substituir todo
o nosso "eu" pela Pessoa de Cristo. Essa
mudança é cuidadosamente explicada em Romanos 6, 7 e 8.
Uma
boa regra é esta: se essa experiência serviu para me humilhar e me fazer menor
e depravado diante dos meus olhos, então é fruto de Deus, mas se serviu somente
para me dar um sentimento de auto-satisfação então é falsa e deve ser rejeitada
na medida que ela só pode estar emanando de mim ou do diabo. Nada que venha de
Deus irá ministrar de acordo com o meu orgulho ou da minha auto-congratulação.
5.
Nosso relacionamento e a nossa atitude para com nossos irmãos cristãos é
outro teste preciso. Algumas vezes um cristão zeloso irá, depois de alguns
encontros espirituais extraordinários, retirar a si mesmo da comunhão com os
irmãos e desenvolver um espírito de censura e repreensão. Ele pode estar honestamente
convencido de que ele está agora num avançado estado de graça e que a “peãozada”
na igreja onde ele congrega não é nada além de um monte de gente misturada.
Este é um perigoso estado de espírito, e é ainda mais perigoso porque ele pode
ser sustentado até mesmo por aqueles que estão à sua volta. O irmão teve uma experiência extraordinária!
Não é o fato dele estar enganado em relação à experiência que prova que ele está
errado, mas a reação que ele teve a estes acontecimentos é fruto da carne. A nova
espiritualidade dessa pessoa o transformou em alguém menos caridoso. Qualquer
experiência religiosa que falhe em aprofundar o nosso amor pelos nossos irmãos
em Cristo deve, seguramente, ser tratada como espúria. (1 João 3:18-19, 4:7-8,
5:1; e João 13:35)
6.
Outro teste seguro é este: Note como a
experiência afeta a nossa relação e a nossa atitude para com “o mundo.” Eu
não quero me referir, é óbvio, à beleza da ordem da natureza. E também não
estou me referindo ao mundo dos homens perdidos. (João 3:16) Certamente,
qualquer toque verdadeiro de Deus numa alma, irá aprofundar a nossa valorização
da natureza e intensificar nosso amor pelos perdidos. Eu me refiro aqui ao mundo
das satisfações carnais, dos prazeres ímpios, da busca pelas riquezas e
reputação nesta terra e da alegria pecaminosa – em resumo, uma sociedade humana
degenerada brincando de caminhar em direção ao inferno, o exato oposto da
verdadeira Igreja de Deus. (1 João 2:15-17; e 2 Coríntios 6:14) Qualquer
espírito que permita um comprometimento com este mundo é um espírito de
falsidade. Qualquer movimento religioso que imite o mundo em quaisquer de suas
manifestações é falso diante da cruz de Cristo e está do lado do diabo.
7. O
último teste da genuinidade da experiência cristã é o que ela faz com a nossa atitude para com o pecado? Tudo aquilo que torna a santidade
mais “atrativa” e o pecado mais intolerável deve ser aceito como genuíno. (Tito
2:11-13)
Jesus
nos alertou, “Pois aparecerão falsos cristos e falsos profetas que realizarão
grandes sinais e maravilhas para, se possível, enganar até os eleitos.” (Mateus
24:24) Estas palavras descrevem os nossos dias muito bem para serem mera coincidência.
Quanto
mais nós nos adentramos no santuário, maior é o risco do auto-engano. O homem
profundamente religioso é, de longe, mais vulnerável do que aquele crente
preguiçoso que lida com a sua religião de qualquer jeito. Este último pode até
ser enganado, mas dificilmente ele será auto-enganado.
A
maioria dos homens, de fato, brinca de religião como quem brinca com um jogo
qualquer, sendo, a própria religião, de todos os jogos, aquele que é mais
jogado universalmente.
O
jardim que não recebe cuidados será em breve coberto de ervas daninhas; o coração que falha em cultivar a verdade e
erradicar o erro irá, em breve, se tornar um deserto teológico.
Um
pouco de incredulidade saudável é, por vezes, tão necessário quanto a fé para o
bem de nossas almas. Não é pecado duvidar de algumas coisas, mas certamente é
fatal acreditar em tudo. Fé nunca significou ingenuidade. Credulidade nunca
honrou à Deus. A mentalidade infantil é como o avestruz que engole qualquer
coisa que lhe parece interessante. Eu já conheci cristãos com tanto
discernimento quanto um avestruz.
A
alma saudável, assim como uma corrente sanguínea saudável, tem uma adequada
proporção de células brancas e vermelhas. Os corpúsculos vermelhos são como a
fé: eles carregam o tonificante da vida, o oxigênio, para todas as partes do
corpo. As células brancas são como a incredulidade: elas agarram toda matéria
morta e tóxica e carregam-na para o ralo. Deste modo, os dois tipos de células
trabalhando juntos mantêm os tecidos em boa condição. Para um coração saudável
deve haver o cuidado de se manter toda e qualquer matéria morta ou venenosa
fora do curso da vida. E é aí onde a pessoa crédula nunca suspeita de nada. Ela é
sempre entregue à fé.
Juntamente
com a nossa fé em Deus deve-nos acompanhar uma saudável incredulidade de tudo o
que é oculto e esotérico. Numerologia, astrologia, espiritismo e tudo o mais que seja estranho e misterioso
e que passar pela religião deve ser rejeitado. Tudo isso é material tóxico e
não tem lugar na vida de um verdadeiro cristão. Ele tem a Cristo, e Ele é o
caminho, a verdade e a vida.
Texto original: "Error and truth travel the same highways". Extraído de A.W. Tozer, Gems from Tozer - Selections from the writings of A.W. Tozer, Camp Hill, PA: Christian Publications, 1979, pp. 57-64. Todos os direitos reservados.Traduzido e revisado por: Felipe Cruz de Melo
Quando erro e verdade viajam pela mesma rodovia - A.W. Tozer
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